A CRIADA E OS GATOS
- mrmadv
- 18 de mar. de 2017
- 2 min de leitura

No caso que se segue, uma empregada doméstica intentou uma acção contra os seus patrões, em cuja residência prestava serviço, alegando ter sido despedida ilicitamente, por mera comunicação verbal e sem realização prévia de processo disciplinar.
Até aqui a situação não tem nada de diferente em relação a milhares de processos que todos os anos dão entrada nos nossos tribunais. Contudo, o processo torna-se único pelos factos sinistros que vieram a ser apurados e que a seguir se descrevem.
Em resposta à pretensão da empregada, os patrões alegaram que o despedimento ocorreu com justa causa, pois aquela assassinara, a sangue-frio, o pequeno gatinho da família. E não só o alegaram, como conseguiram mesmo provar esta versão em julgamento.
Com efeito, o Tribunal considerou provado que, no dia 17 de Novembro de 2005, pelas 12h20, a patroa entrou em casa e encontrou a empregada sozinha, a fazer a limpeza da sala. Por detrás do sofá, jazia no chão, a sangrar abundantemente da boca, o gato pequeno das filhas dos patrões. O gato sempre fora saudável, pelo que nada parecia justificar o sucedido. Os patrões levaram o gatinho ao hospital veterinário, mas o mesmo acabou por falecer, no mesmo dia.
Ficou demonstrado, no processo, que o gato faleceu vítima de traumatismo crânio-encefálico com hemorragias internas, e que o mesmo terá sido esmagado entre o sofá e a parede, numa altura em que só a empregada se encontrava em casa.
No próprio dia do falecimento do bichanito, os patrões informaram a empregada que, devido ao sucedido, tinham deixado de confiar na mesma, e prescindiam de imediato dos seus serviços. Pelo término do contrato, pagaram-lhe ainda a quantia de 944,30€.
No entanto, como não cumpriram as formalidades legalmente exigidas para o despedimento, a empregada encheu-se de razões e decidiu accionar judicialmente os patrões. O despedimento foi mesmo considerado ilícito pelo Tribunal, e os patrões acabaram por ser condenados a pagar à empregada uma indemnização no valor de 2.438,80€.
Não satisfeita com este montante, a empregada ainda recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa pedindo uma indemnização superior, mas o recurso não teve provimento.
No processo, ficou também provado, que, anteriormente, um outro gato da família havia caído da janela, em circunstâncias não apuradas, quando se encontrava em casa sozinho com a empregada. Tendo em conta que a senhora trabalhou, naquela residência, desde abril de 2004 até Novembro de 2005, não é difícil imaginar que os felídeos não terão tido vida fácil durante esse período.
De referir que, à data, não existia qualquer legislação que criminalizasse os maus tratos infligidos a animais domésticos.
Apesar do que a senhora poderá ter feito aos gatitos, em rigor não se pode dizer que a solução do caso tenha sido injusta, pois o Tribunal fez uma correcta aplicação da lei. Não se pode despedir um trabalhador sem prévia realização de processo disciplinar. Enfim, poderá ter-se feito justiça no mundo dos Homens, mas ficou certamente por fazer no mundo dos gatos.
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